sexta-feira, novembro 11, 2011

Dia de Faxina



Por Nathalia Moraes

  Hoje acordei meio Marinete, a diarista, sabe? Querendo limpar, organizar, desinfetar. Confesso que isso não é muito comum, por isso quando acontece, tenho que aproveitar ao máximo, arrastar todos os móveis e tirar todas as minúsculas teias de aranha de cada cantinho. Comecei bagunçando tudo, porque mesmo que soe contraditório, só consigo assim, organizar desorganizando. E no meio daquela bagunça toda, encontrei uma caixa.
     Coloquei uma daquelas máscaras pra conseguir sobreviver as poeiras acumuladas sobre a tampa da tal caixa, aquelas caixas que ficam amontoadas no fundo de nós mesmos, esquecidas e bagunçadas, cheia de papeizinhos, choros, risos e lembranças de anos, boas ou nem tanto, que a gente vive adiando pra limpar.
     Sempre ouvi minha mãe dizer que eu guardo muita tralha, mas não sabia que era tão real assim, e fui descobrir ali que ela estava certa, e o quanto pesa guardar todas essas coisas. Hora de separar o que realmente me é importante, e o que só estava ali pra fazer peso... joguei tudo no chão, limpei a caixa, tirei toda a poeira e fui separando, fica ou lixo. E adivinhem o resultado? Muito mais coisas pra jogar fora, pura tralha mesmo. Eu sei, eu sei, já ouço a voz dos politicamente corretos me dizendo: "não cuspa no prato que comeu, menina!", mas dispenso os bons modos, pelo menos agora, hoje. Tudo que for pra me fazer bem, quero carregar comigo, mas estou dispensando o peso de tudo que um dia já me fez mal.
     Então comecei a separar, e foi mais ou menos assim: sorrisos sinceros, daqueles de senhorinhas de bairro logo pela manhã, banho de mangueira com as primas no quintal da vovó, mente aberta e criativa, música boa no volume máximo: fica. Olhar da vizinha condenando cada passo, ilusão, notícia ruim na tv, desigualdade: lixo. Abraços apertados de saudades, por idas e vindas, apenas abraços apertados: fica. Pessoas reclamando de tudo o tempo todo: lixo. Olho no olho, verdades (até as mais dolorosas), cheirinho do feijão da mamãe feito na hora: fica. Falsas amizades, pessoas interesseiras, vazias e mal-educadas: lixo. Mãos estendidas, olhar de compaixão, compreensão, bom coração: fica. Fofocas, maus-tratos, inveja e o número do celular daquele babaca: lixo. Gargalhadas com as amigas, porre com as amigas, choro com as amigas, ou só as amigas: fica. Falta de opinião, padrões impostos, mensagens sem resposta: lixo. Bilhetes de teatro, cachorrinho abanando o rabo quando chego em casa, beijo no portão: fica. Insegurança, ignorância, intrigas, irritações, inimizade, injustiças e idiotas, lixo. Bom humor, bom senso, bocas macias, borboletas no estômago, bombom de avelã fica. Grito de chefe, despertador sem mais cinco minutinhos, mentes fechadas e pequenas, ódio, rancor e mau humor de manhã, lixo. Sonhos, comprimentar do porteiro ao presidente, suco de laranja bem geladinho no verão: fica. Pé gelado no frio não.
      Até que encontrei uma coisinha, e lá veio a dúvida: fica ou vai lixo? Não quero mágoas, pessoas que enganam, que tem medo, que não se jogam, que não vivem, que não se permitem, que não assumem, que traem, que não beijam de olhos fechados... mas quero caminhar de mãos dadas na beira da praia, apelidinhos que envergonham os amigos, filme abraçado no sofá, ter pra quem ligar quando a saudade apertar, quero beijos com vontade, abraço de corpo inteiro... decidi então que o amor fica.
       E assim eu fui me livrando de tudo que me fazia mal, que pesava nos meus ombros, que me sufocavam, e guardei só o que me interessa de fato. E agora na caixa, tinha um espaço enorme pra eu encher de novo, porque só funciona assim, para que caiba coisa nova, precisamos nos desfazer das antiguidades com cheiro de naftalina, não dá para ir amontoando sem parar. Mas agora eu me obriguei a só guardar o que for bom, leve e tranquilo. Não quero mais ter que carregar o peso das coisas que não me servem mais, que me fazem ficar presa no chão, quero voar, ir além, sair por aí sentindo a brisa no rosto, sem aprisionamentos imbecis. 
       Viver, sonhar, errar, acertar, aprender, cair, levantar... Porque eu sei que não dá pra escolher apenas a cereja do bolo, tem que comer todo o bolo, e nesse bolo tem o que é bom, o não tão bom, o péssimo e até o lixo, tem que comer tudo. Mas vai de você, escolher o que você vai guardar na sua caixa, vai de você ficar pensando em como poderia ter sido feliz, ou ser feliz a partir de hoje. Vai de você guardar coisas, pessoas e sentimentos pesados, o ombro é seu, as costas doloridas no final da noite incomodando pra dormir, a caixa pesada e empoeirada é sua. Vai de você escolher o que fica, e o que vai pro lixo. Portanto viva o que a vida tiver pra você, mas guarde apenas o que te faz bem.
       E foi no meio dessa faxina que eu aprendi: Tudo que não me desperta a vontade de sorrir, é pesado de mais para eu carregar comigo.
    

5 comentários:

  1. Parabéns, muito bom lindonaaaa... Além de tudo ainda me fez lembrar que eu também tenho um blog, só que bem largadinho tadinho hihihih... Abraço gata!

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  2. Aqui kkkkkkk quem fala kkkkkkkkk é o Victor Marson kkkkkkkk...

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  3. Victor lindoo!!!
    Obrigadaaaa.. ressucita esse blog aí e bóra se entregar a esse mundo fora do comum, a escrita!
    Beijos!

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  4. Um dos meus textos preferidos. Excelente!!
    Talyta

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